quinta-feira, 1 de março de 2012

Herói da infância (final)

*Esse texto continuação, abaixo parte 1.
Nesta época lúdica, quase mágica, sem celulares, internet e preocupação inexistente. Jogava pedrinha na água e ria quando picava. Corria por diversão para sentir o vento. Lia como brincadeira, assistia desenhos e gostava de ficção. Sonhava, acreditava, vivia com ausência de agenda e a rotina liberada de stress.
Eu tinha criação inusitada, secreta, sigilosa, mantinha escondido, só tinha um cúmplice o vô, evitava contar sobre o hábito de criar bichos considerados bizarros. Curtia o processo de manutenção do zoológico, alimentação, cuidados diários com cada habitante e estranhava particularidade no comportamento dos bichanos. No fundo das prateleiras e gavetas do guarda-roupa, vidas se multiplicavam. No mini zoológico infantil, as jaulas eram feitas com potes ou vidros, com furos na tampa e algum animal dentro. Lagartixas, lesmas, aranhas, borboletas, gafanhotos, escorpiões, separados por espécie, dividiam o espaço no imaginário e interagiam.
Na casa do vô não faltava diversão era uma farra por lá. Quando chegava comentava regras básicas, evitar contato com cobras e nunca matar nenhum animal. Mostrava os ponteiros do relógio, meio dia hora do almoço, mas era livre ninguém precisava voltar. Bastava colher frutas e suprir a fome. As refeições eram feitas por ele, curtia cozinhar, doces fazia como ninguém, recordo a torrada de pão francês com queijo e tomates.  Seis horas, o horário de partida, sabia estaríamos distraídos brincando. Avisava com sequência de buzinadas o momento do retorno a realidade.
Eu ficava em volta do açude, pescando, levava sempre junto dois baldes, um para os peixes e outro para as pitangas. No decorrer do dia, após comer pitangas, selecionava os peixes atrativos e iriam direto para meu aquário. Ao contrario de outras crianças compravam em lojas, tinha exclusivos, lambari, cascudo, pintado e até mussum nadou pelo aquário.
No meu aniversário de cinco anos, caiu na páscoa, o vô teve uma ideia, levou cerca de 30 coelhos vivos e nada de previsível. Tinha ovo de páscoa aos montes, caixas de bombons, coelhos de chocolate para turma. Um dia sem igual no colégio, meus amigos lembram até hoje dos coelhos pulando saltitantes pela sala aula, coisa que muitos nunca tinham visto. O vô sempre com sugestões, fantásticas e encantadoras. Na verdade o Herói da Infância, parecia uma criança com imaginação fértil e sonhadora.
Tempo passou, fui crescendo, vida seguiu, infância guardada como lembrança positiva na memória. Passava direto na casa dos meus avôs, curtia o contato e escutar histórias, me divertia ria dos casos, parecia criança novamente pela alegria espontânea. Na frente da televisão a vó preocupada com o destino do personagem de novela, Vô nem olhava só falava comigo e ignorava a programação televisiva, os nossos assuntos nunca acabavam. Na pausa da conversa, um doce abobora feito pelo vô.
O vô tinha duas coleções peculiares: amizades e facas, onde passava quase festival do oi de tantas saudações. No aniversário presente faca e ausência de erro na escolha. Criei uma terceira coleção inusitada para o vô, a cada corrida rústica, eu levava minha camiseta da prova, regatas ou no estilo mamãe quero ser forte. Ele não tinha frio era forjado na mistura de raças, portanto inverno e verão, eram apenas mudanças de dias no calendário, as vestimentas curtas se mantinham durante o ano todo. 
Na convivência não faltaram palavras, nem sentimento, mas os heróis na vida real, são eternos na lembrança, na memória, mas não no corpo fisico e chegou o dia do desfecho. Antes de ser hospitalizado, falou rindo: Bobagem.  O vô foi para o hospital, eu fiz questão de estar com herói da minha infância na batalha final. Chegava o momento do último combate e fechar o ciclo. Me aproximo dou um beijo na testa, falo meu querido descanse em paz. Porém continua, permanece vivo, basta escutá-lo com o coração! (por Iberê)

Nos adicione no MSN >>>  o-cercadinho@hotmail.com 

Dica: Leiam os textos feitos pelo Marcão, histórias marcantes, contadas com realismo. Descreve os fatos de maneira direta, sem receios ou pudores.

6 comentários:

Wanderlei disse...

Iberê,

Nos conhecemos a mais de trinta anos, e pela primeira vez desde muito tempo, que te digo: PARABÉNS POR ESSES DOIS TEXTOS!
Por pouco não chorei, e é sério.
O que nós (eu e os demais que saíram) sempre batemos na tecla era isso. Que tu escrevesses todos os textos, como escreveu esta pérola (Herói da Infância).
Na boa? Bato palmas pra ti.
Abraços do amigo sumido, mas sempre presente...

Wanderlei

Simey Lopes disse...

me senti uma criança quando li, visualizando um avô super legal e uma vida de interior... sonho.
parabens, e concordo com o wanderlei... este é uma pérola... ;)

O Cercadinho disse...

Wanderlei, apenas um relato, uma história real contada de forma suave, um tentativa de conto infantil.

abs
(por Iberê)

O Cercadinho disse...

Simey Lopes, obrigado, o foco do texto era contar histórias da época de piá de maneira leve.

bjs
(por Iberê)

Stela disse...

adorei o texto querido.
Me certificou mais uma vez que és uma pessoa sensivel e especial.
Maravilhoso relato.
bjs bjs

O Cercadinho disse...

Stela, grato pelo elogio, apenas tentei contar uma história de forma leve.

bjs
(por Iberê)

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