quinta-feira, 1 de março de 2012

Herói da infância (parte 1)

Personagem capaz de façanhas e proezas, definição básica de herói. Na televisão aos montes, nos desenhos animados poderes ilimitados. Tem poder para quase tudo, poderia perder linhas comentando da força do Huck, agilidade do Batman ou outro mito fictício. Ao contrário destes de ficção, esse conto sobre um real ou quase. Esquisito, engraçado, descontraído, hilário, o herói da minha infância, vô tinha uma sintonia única, força, afeto, carisma e humor.
Na infância, eu ficava na porta, ansioso esperando, chegada que era nada discreta. Buzinadas frenéticas e presa, o tempo parecia sempre atrasado para tantas atividades. Com dois anos, falava quase nada, mas junto com meu irmão mais velho, éramos presença na programação dos dias ensolarados dele.
O trajeto até sair da cidade de Porto Alegre, a cada parada de sinal, crianças correndo em direção ao veículo e muitos pedintes. Qualquer motorista se irritaria, fecharia o vidro, aceleraria e avançaria. Para o vô era impossível ignorar, não admitia, deixar pessoas sem atenção além de julgar como desumano e cruel o ato. Portanto criou uma maneira inusitada de tentar ajustar e adoçar ao menos por uns instantes as vidas. Quando corriam para pedir algo, tinha sempre um saco cheio de balas. Fazia até questão de parar e chamar. Olhavam desconfiados, e saiam rindo com mãos repletas de bijuterias. As guloseimas definidas como bijuterias, não eram jóias, mas podiam agradar. Então onde passava a exemplo da história de João e Maria, deixava um rastro de doces adocicava vidas, por uns segundos liberava os sonhos.
Após as paradas doces, estrada de chão rumo ao sitio, tipos peculiares do campo, velhos de chapéu de palha, guris caminhado com enxada nas costas e senhoras com sacola repleta de frutas, ali estranhos era impossível, passarem desapercebidos. No carro rádio ligado em músicas clássicas, conversas sem fim e descontraídas. A cada quilometro percorrido aumentava o som do mato, canto das aves, vento e barulhos de bichos variados. Ao redor carroças e pessoas educadas acenando a quem passava. Chegava a ser engraçado parecia intimo de todos, mas alguns nunca vistos, no interior os costumes são outros.
Delirava em fazer parte de um imaginário, encantador, bichos os quais outras crianças viam em zoológicos ou nem conheciam, via ao vivo. Olhos ficavam repletos e sensação de sonhar, livres como as pernas para correr no mato e soltos como aves para voar na imaginação. Via árvores repletas de frutas, céu carregado de passarinhos, local sossegado, ao ponto de escutar barulhinho da pedra quicando no açude. Curtia tirar do pé, frutas frescas e comer. Sou viciado no consumo de frutas, ao ponto de ser comparado ao um sabiá por meu pai. Fazem parte do meu cardápio, alternando as combinações de acordo com a estação de cada.
Na chácara, casos hilários, exóticos, estranhos e pitorescos, surgiam com facilidade. Dentro de galpão com mantimentos vô começou arrumar e levantou a tampa de um tonel de ração. Barulho e um pulo, no ar um gambá, no instinto dá um soco no bicho e derruba no chão o animal. Estava cercado por netos em volta, pegou o tal gambá e botou em gaiola no meio do galinheiro. As galinhas, passavam assustadas e desviavam o olhar do bichano, uma fêmea e sete filhotes de gambazinhos. Os galos até encaravam de canto mostrando equilíbrio e controle sobre o espaço. Entre os bichos, quase arca de Noé, animais dos mais variados, porcos, vacas, ovelas, cavalos, patos, galinhas, além dos nativos da região como gambá e outros. Mimosa produzia trinta litros de leite por dia, estava esperando primeiro filhote e recebia os mimos de todos.
O sumiço da vaquinha prenha, única pura da raça jersey no rebanho. O terneiro estava para nascer, preocupação ninguém encontrava o bicho e começa anoitecer. O vô entra no meio do campo fechado e começa chamar pelo animal. Mimosa se assusta com lanterna e acaba indo na direção dele, como em tourada acerta.  Resultado rosto vermelho, orelha quebrada e lesões. Pelo estrago se desloca para emergência hospitalar. No local começam questionar, sobre o acidente. Ao entrar avisa fui atropelado. Perguntam se por acaso lembrava placa. Vô Ivon fala, sei o nome foi a Mimosa. Atendente indaga: O senhor conhece essa Dona Mimosa? Vô que dona, é uma vaca! Recepcionista, calma o senhor está agitado pelo atropelamento. Vô aos risos: Agitado nada estou é dando risada, devo ser único caso de atropelamento por vaca.
Plantação de casinhas de passarinhos, um devaneio, mas era real, surgiam na terra, quase prontas de planta com nome esquisito, porongo. Viam no formato perfeito para moradia de aves, bastava fazer um furo no meio e limpar miolo. No período de cria, laranjeira, pessegueiro, abacateiro, pouco importava a árvore, quando tinha ninhos ficava interditada o acesso. Vô colocava placa não perturbe novos inquilinos. Também nunca se podia tirar todas as frutas de um pé, algumas ficavam para consumo dos passarinhos. Vô falava, se faltar compramos, mas eles ficam com fome e podiam até morrer. Portanto essa regra seguida a risca por todos.
Ceia escapa, antes de ir a mesa. Na véspera de natal, peão pega um porco no chiqueiro para virar prato, escolhe o menor para entrar na travessa. Animal foge e corre gritando, em direção ao vô, pedindo ajuda, socorro. A cena comovente, valeu para sobrevivência. Acabou sendo poupado. mas cresceu ficou forte, enorme, quase um touro. O porcão puxava carroça e fazia o serviço de boi era gigante e mostrava alegria por estar vivo e contribuía com trabalho na roça.  
*Amanhã continuação e final deste conto. (por Iberê)

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Dica: Leiam os textos feitos pelo Marcão, histórias marcantes, contadas com realismo. Descreve os fatos de maneira direta, sem receios ou pudores.

2 comentários:

Anônimo disse...

O Luciano Huck virou herói? Não sabia.
Brincadeiras a parte, belo texto, como há muito tu não escrevia. Parabéns, Iberê.
Aguardando a parte final.
Beijos.

O Cercadinho disse...

Anônimo, tentei pegar uma crônica pessoal com conteúdo denso virar um texto leve infantil. Porém foi uma tentativa, ainda precisa ajustar. Agradeço o elogio ao texto.

abs
(por Iberê)

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